É um marco na luta antimanicomial”, diz promotora de Justiça
Na última segunda-feira, 4, a prefeitura de Nova Friburgo assumiu a gestão do Hospital Psiquiátrico Santa Lúcia. O desfecho ocorreu após longo período de tratativas entre a clínica, o poder público municipal e a 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Nova Friburgo. A ação também contou com apoio do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Cíveis e Pessoa com Deficiência (CAO Cível/Pessoa com Deficiência), do CAO Saúde e do Grupo de Apoio Técnico Especializado (GATE/MPRJ).
De acordo com o MPRJ, o município deveria assumir a gestão do serviço para garantia de direitos das pessoas internadas e iniciar a desinstitucionalização, “diante da inadequação da instituição aos parâmetros de respeito aos direitos das pessoas com transtornos mentais, visto que o custeio se dá por recursos financeiros do Sistema Único de Saúde (SUS)”, alertou o órgão.
“É um marco na luta antimanicomial e se revela apenas o primeiro, mas importante, passo destinado a extirpar a odiosa lógica manicomial. Esta lógica ainda sobrevive numa visão higienista e excludente dos direitos das pessoas com deficiência, cidadãos que possuem os mesmos direitos a acesso a serviços públicos que o restante da população, porém adequados às suas peculiaridades.”, comentou a promotora de Justiça Claudia Canto Condack, titular da Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Nova Friburgo.
Pacientes internados não apresentavam crise
No ano passado, foi realizado um Censo na instituição. A constatação, segundo o MPRJ, foi a de que 26 pessoas estavam internadas no local há mais de 10 anos, outras 27 pessoas estavam há mais de cinco anos e mais 34 há pelo menos dois anos. Também chamou atenção a constatação de que quase todos os pacientes não estavam em crise quando da realização das visitas para elaboração do Censo, e de que a única atividade proporcionada na instituição é “caminhar na clínica durante o dia”, informou o órgão.
O Censo foi elaborado pela Coordenação de Atenção Psicossocial, o Núcleo Estadual de Saúde Mental, e a Equipe de Saúde Mental de Nova Friburgo e dos demais municípios que transferiram pessoas ao local , com apoio de estudantes do Centro Universitário Serra dos Órgãos (UNIFESO). O MPRJ informou também que, antes disso, um relatório produzido no âmbito da Inspeção Nacional de Hospitais Psiquiátricos, publicado em 2020, constatou que o local era insalubre e de violências cotidianas, que vão da falta de planos individualizados de tratamento à privação de liberdade.
No ano passado, município decretou intervenção na clínica
Em maio de 2021, em razão de recomendação do MPRJ, o município de Nova Friburgo publicou decreto estabelecendo a intervenção e, na mesma data, se direcionou ao Hospital Psiquiátrico para assumir o serviço. No entanto, o MPRJ afirma que o Hospital Psiquiátrico Santa Lúcia impediu o acesso pela Subsecretaria de Saúde Mental às dependências da instituição, o que apenas se concretizou na presente data.
Clínica era um dos últimos hospitais psiquiátricos
No Estado do Rio ainda restam alguns Hospitais Psiquiátricos, dentre eles o Santa Lúcia, inaugurado em 1965 e que, nos últimos anos, conveniado ao SUS, se mantinha exclusivamente com recursos públicos.
Ainda de acordo com os CAOs, com a incorporação do serviço, inicia-se efetivamente o trabalho de desinstitucionalização do Hospital Psiquiátrico Santa Lúcia, para garantia de direitos das pessoas que estão hoje internadas no local e oferta de cuidado de qualidade.